Educação: por que precisamos falar sobre a morte sem preconceitos

Psicóloga do Grupo Morada da Paz ressalta a importância de abordar o tema em escolas, universidades e famílias, quebrando o silêncio que dificulta o enfrentamento do luto

Embora seja uma certeza universal, a morte ainda é um dos temas mais evitados nas conversas cotidianas, nas salas de aula e até mesmo nas formações acadêmicas. Para a psicóloga especialista em luto do Grupo Morada, Simône Lira, romper esse silêncio é fundamental para preparar emocionalmente as pessoas, reduzir sofrimentos desnecessários e transformar a forma como lidamos com a perda.

A chamada Educação para a Morte, conceito amplamente estudado por especialistas como Maria Júlia Kovács – pesquisadora brasileira sobre questões de luto e bioética -, propõe inserir reflexões sobre a finitude da vida de forma natural e cuidadosa, tanto no âmbito familiar quanto no educacional. Para Simône Lira, não se trata de um discurso mórbido, mas de um convite para olhar para a vida de maneira mais consciente.

“Falar sobre morte é entender a condição de finitude que é inerente a todos os seres humanos. E, tendo essa consciência, a pergunta que fica é: o que estamos fazendo com o tempo que temos?”, afirma a psicóloga.

A especialista alerta que, ao evitar o tema, criamos lacunas que se revelam dolorosas em situações de perda. Decisões importantes, como desejos para o próprio velório ou formas de despedida, muitas vezes ficam indefinidas, gerando dúvidas e conflitos entre familiares. “Quando a educação para a morte é trabalhada, ela facilita o acesso a informações, ajuda a compreender o processo de luto e prepara as pessoas para lidar com as despedidas de forma mais consciente e respeitosa”, pontua.

A ausência desse diálogo também impacta o ambiente escolar. Casos de morte de professores, colegas ou funcionários, muitas vezes, não são comentados para “evitar sofrimento dos jovens”. Simône ressalta que essa postura, conhecida como conspiração do silêncio, pode confundir crianças e adolescentes.

“As crianças percebem a ausência, mas sem explicações seguras ficam sem compreender o que aconteceu. Falar sobre morte no seio familiar dá abertura para que as escolas também trabalhem o tema, de forma lúdica e adequada à faixa etária”, explica.

No campo acadêmico, especialmente nas áreas da saúde, o assunto continua sendo pouco explorado. Profissionais que lidam diariamente com a morte, seja de pacientes humanos ou de animais, raramente têm espaço para elaborar o próprio luto, o que pode gerar sobrecarga emocional e adoecimento. “Ainda existe a ideia de que o profissional de saúde não deve se vincular emocionalmente ou demonstrar fragilidade, mas isso não condiz com a realidade do cuidado humanizado”, reforça.

A psicóloga defende que falar sobre a morte é, na verdade, falar sobre vida. “O luto não existe apenas por causa da dor, mas por causa do amor. Esse vínculo permanece, mesmo sem a presença física, e as memórias se tornam um sustento para quem fica”, finaliza.